Se soubesse escrever
Falaria da vida que passa sem ser notada
Do nascer e pôr do Sol que já não encanta
E dessa estranha solidão em um mundo cada vez mais cheio
Se soubesse escrever
Exporia as dores engolidas e que engolem tanta gente
E falaria de esperança aos que sempre habitam à margem
Se soubesse escrever
Chamaria a atenção para o poder existente nas coisas simples
O poder da da tolerância, do cuidado, do amor
Mas, não sei escrever!
Então, me calo, venero a passagem da vida
A passagem do Sol, a respiração que agora sinto
Enquanto pulsa meu coração sedento por continuar aqui
Se soubesse escrever
Ah! , eu choraria em verso e reverso a dor das fomes
Fome de pão, fome de água, fome de justiça, fome de amor
Choraria nosso crônico desencanto com tudo, por tudo
Choraria nossa solidão nessas estranhas ilhas perdidas em grandes multidões
Choraria esse desespero virtual, virtualmente real
Eu choro enquanto canto as dores do mundo!
Mas, não sei escrever
Então, me calo, e venero a passagem da vida
A passagem do Sol, a respiração que agora sinto
Enquanto pulsa meu coração sedento por continuar aqui
O que me resta, então?
Somente cantar, cantar minhas dores, as dores do mundo
E, até mesmo enquanto durmo, só me resta cantar e talvez assim
Suscitar uma beleza escondida, quem sabe? Na infância da vida
Mesmo que soubesse escrever, provavelmente não o faria
Antes, pisaria nesse chão nosso de cada dia
E enxugaria as lágrimas dos que choram
E cantaria a morte e a vida com gratidão
Entendendo que ambos são um só dom
Tão maravilhoso quanto de curto prazo